terça-feira, 22 de maio de 2018

Que tal tratar de profissionalização da gestão em vez de privatização?


Falar de privatização dos Correios tem sido um expediente utilizado por autoridades e dirigentes para desviar o foco da questão principal que é a má gestão da Empresa.

O subterfúgio acaba aprisionando os incautos e realmente desviando o foco daquilo que deveria estar sendo bem discutido no Brasil dos tempos atuais – a qualidade da gestão das estatais.

Em junho próximo termina o prazo para implantação da Lei nº 13.303/2016 nas estatais. Neste momento, seria de se esperar que contássemos nas estatais com melhorias substanciais de gestão, fruto especialmente da aplicação de critérios mais rigorosos para a escolha de dirigentes.

O que se vê, porém, na prática, é que, em geral, os dirigentes continuam a ser políticos ou politicamente indicados. Houve avanços a comemorar na regulamentação de governança nas estatais? Certamente. Mas o que precisa mudar de fato ainda está por acontecer – a ingerência política tem que ser afastada totalmente das estatais.

Até bem recentemente, tínhamos nos Correios um ex-Presidente de partido político como Presidente da Empresa. Foi designado às vésperas da entrada em vigor da Lei nº 13.303/2016, quando todos já conheciam bem o seu teor, especialmente o Presidente da República. O velho jeitinho brasileiro, porém, prevaleceu e a designação ocorreu, com todas as consequências que daí adviriam, porque a indicação era de um partido aliado do Governo.

As estatais não deveriam pertencer ao governo de plantão, como se pratica aqui, mas sim ao Estado. Seus dirigentes deveriam ser muito bem selecionados, entre os melhores servidores de carreira ou entre os melhores candidatos do mercado, e não indicados por caciques políticos, donos de partidos ou coisa do gênero.

No caso dos Correios e de outras estatais, essa deveria ser a discussão em pauta e não a privatização, pois ao cidadão pouco importa se a empresa é pública ou privada, desde que seja bem administrada e, consequentemente, entregue bons serviços e resultados. 

E o Ministério do Planejamento e outros órgãos do Governo Federal deveriam ser fortemente cobrados a respeito do que está sendo feito efetivamente para assegurar que as estatais tenham dirigentes devidamente qualificados e escolhidos sem interferência político-partidária, pois é isto que realmente importa para mudar para melhor a gestão dessas organizações.

4 comentários:

  1. Marcos César, parabéns pelo seu posicionamento sobre a profissionalização da gestão e por sua atuação de Conselheiro. É isto que esperamos que ocorra com a "nossa empresa" e com as demais estatais.
    Ricardo Dávila

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  2. Comentário recebido de José Osvaldo Fontoura de Carvalho Sobrinho:

    Caro Marcos,

    Desculpe o meu possível (provável) “sincericídio”, mas essa análise mostra-se absolutamente enviesada, talvez pela paixão que tendemos a ter por termos passado tanto tempo na Empresa. Ordinariamente, esse tema gera tende à polemização, especialmente em razão das paixões doutrinarias, conforme o lado em que se posiciona.

    Historicamente, o modelo de empreendimentos estatais adquiriu vida no entorno da Revolução Industrial do fim do século XIX e na Esteira de Revolução Francesa, com o crescimento acelerado da economia e dos mercados, sem que a iniciativa privada estivesse suficientemente organizada e capacitada a fazer os investimentos necessários para acompanhar essa dinâmica.

    Nos Estados Unidos, a estatização empresarial tomou força durante a época do chamado New Deal, para permitir que o Estado pudesse circunstancialmente regular as atividades empresariais de grande porte nos anos imediatamente posteriores al grande crack do mercado de capitais americano. No Brasil, ganhou corpo na era Vargas, com o início do processo de industrialização. Mais uma vez, à falta de entidades privadas organizadas e suficientemente capitalizadas para prover os vultosos investimentos necessários à formação de uma economia industrial, o Estado brasileiro tomou a frente, com a criação de grandes estatais como a Companhia Siderúrgica Nacional (1940), a Companhia Vale do Rio Doce (1942) e a Petrobrás (1953), e assim foi pelas décadas seguintes.

    (continua no próximo comentário)

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  3. Continuação do comentário de José Osvaldo:

    Ninguém duvida do mérito da criação da ECT como empresa estatal em 1969, o que se mostrava absolutamente necessário e só foi possível à época pela forte disciplina militar, que promoveu uma consistente normalização operacional e intensiva formação e treinamento de mão-de-obra.

    Entretanto, há na atualidade dois fatores essenciais a indicar a necessidade de privatização de diversas atividades econômicas hoje sob a gestão do Estado, sendo um de ordem econômica e outro de ordem política, que se complementam de forma quase simbiótica.

    No lado econômico, é cediço que o mercado possui atualmente total condição de bem exercer diversas atividades econômicas hoje sob comando estatal, estando até mesmo mais capitalizados que o próprio Estado brasileiro para fazer frente aos investimentos necessários, e faz isso de forma claramente mais eficientes que as inciativas estatais.

    Do ponto de vista político, especialmente em um ambiente de presidencialismo de coalizão, chega a ser pueril esperar que o governo de plantão, seja qual for a sua matiz partidária, poderia estar ou vir a estar empenhado na busca da eficiência da gestão da empresas estatais em primeiro plano. Ao contrário, o que sobressai e ocupa integralmente corações e mentes dos governantes é fazer acordos que permitam a governabilidade. Tendo isso em mente, o nome do jogo é: distribuição de cargos em troca de votos no congresso e apoio político difuso.

    As estatais podem sim ser quase tão eficientes como as empresas privadas, mas isso dependeria de um raciocínio essencialmente técnico e profissional, que as evidências empíricas demonstram ser impossível de encontrar em um cérebro político. Por outro lado, nas empresas privadas eficiência/eficácia não dependem da vontade ou formação doutrinaria dos investidores/administradores, mas de uma absoluta necessidade de sobrevivência em um mercado crescentemente competitivo.

    Além disso, há um outro argumento de ordem macroeconômica e fiscal a ganhar cada vez mais importância na orientação das políticas governamentais em relação ao desempenho de atividades econômicas pelo Estado: é inaceitável manter centenas de bilhões de dólares alocados a empresas estatais para executarem atividades econômicas que podem ser perfeitamente desempenhadas pela iniciativa privada, provida a necessária regulamentação. Isso é aplicável particularmente no caso brasileiro, por tratar-se de um Estado que não consegue administrar recursos suficientes sequer para cumprir as suas obrigações básicas, como saúde, educação e segurança pública.

    No lado microeconômico, as empresas controladas pelo governo sofrem, invariavelmente, os eternos conflitos de agência, com pouco ou nenhum incentivo para a eficiência e inovação, dada a forte influência política, especialmente em regime presidencialista de coalizão.
    (continua)

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  4. continuação do comentário de José Osvaldo:

    Não é por outra razão que os cargos mais relevantes são sempre preenchidos com foco no apadrinhamento e interesses de determinados grupos, em detrimento da competência dos funcionários, em que pese a existência de legislação que deveria induzir o contrário, mas acabam virando letra morta. Os exemplos recentes e mais emblemáticos (BNDES e Petrobrás) parecem ser suficientemente eloquentes quanto a essa realidade.

    Não é por outro motivo que tem sido quase regra a profusa contratação imotivada de empregados, geralmente por motivação política. Isso ocorre porque os incentivos que movem o Estado e os empresários privados são absolutamente díspares. No primeiro caso, mais valem os chamados “dividendos políticos”, enquanto no segundo, a necessidade de lucro e/ou ganhos de capital é o motor central da gestão, forçando a eficiência produtiva e alocativa. Em uma empresa pública, em que o Estado é o controlador, lucro e ganhos de capital são figuras quase abstratas, por serem destinados de forma difusa e, em última análise, diluído na cabeça de milhões de contribuintes, que dificilmente conseguem associa-los aos impostos que pagam.

    Por tudo isso, meu caro Marcos, sou absolutamente a favor da privatização, não só dos Correios, como também de qualquer outra atividade econômica que esteja nas mãos do Estado que, com a devida regulamentação, possa ser exercida mais efetivamente pela iniciativa privada.

    Tenho certeza de que não era essa opinião que você e muitos dos nossos colegas e ex-colegas gostariam de ler neste momento, mas é o que penso e o que têm demonstrado as evidências empíricas submetidas a análises primordialmente técnicas, desapaixonadas e desprovidas de doutrinações corporativistas ou de cunho político-partidárias. As interpretações minimamente instruídas podem variar um pouco, mas dificilmente escaparão do eixo central que se apresenta.

    Sds,

    J. O. Carvalho

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